Neilson S. Meneses *
Até os anos 70
do século passado Sergipe era um Estado predominante rural e sua base econômica
estava assentada em uma agricultura pouco modernizada e uma industrialização
ainda incipiente concentrada em alguns poucos municípios, a exemplo de Aracaju
e Estância.
Entretanto a partir desta década, começa um processo de
modernização da economia sergipana estimulados pela política industrial da
SUDENE (Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste) e pelos efeitos da
chegada da PETROBRAS ao Estado. Além disso, nessa década também se inicia um
processo de modernização da agricultura sergipana com projetos de irrigação e
estimulo a produção de frutas para as recém chegadas agroindústrias de exportação
de suco concentrado.
Tudo isto resulta em um processo de urbanização crescente
e contribui a redirecionar em boa parte os fluxos migratórios para áreas
urbanas do próprio Estado, especialmente para a capital Aracaju, município que
recebe o maior número de migrantes.
É no contexto dessa evolução urbana e industrial que se
amplia a questão das assimetrias e desequilíbrios territoriais no Estado. Em
1970, mais da metade da população sergipana, 53,9 %, vivia na zona rural, já em
2010, segundo dados do FIBGE, 73,5 % vivia nos centros urbanos, transformando
profundamente a realidade do Estado.
Essas transformações aceleradas afetaram, entre outras coisas, a
distribuição demográfica e econômica e colocaram em evidência a problemática da
centralização versus descentralização e da concentração administrativa versus a
proximidade decisória.
O
processo de urbanização contínuo entre 1970 e 2010, apresenta como uma de suas
principais características a concentração territorial da população. Segundo
dados do censo 2010 (IBGE) 60,2% da população urbana sergipana vive em apenas 5
cidades (Aracaju, Nossa Senhora do Socorro, São Cristóvão, Itabaiana e
Estância) com mais de 50 mil habitantes e que representam apenas 5,3% do total
de cidades. Três destas cidades (Aracaju, Nossa Senhora do Socorro, São
Cristóvão) junto com a cidade de Barra dos Coqueiros formam a chamada grande
Aracaju que concentra em seu entorno atualmente (2010) 52,2 % da população
urbana do estado
Ocorre também
uma concentração em termos de população total, já que em tão somente em 6
municípios, com mais de 50 mil habitantes do Estado (Aracaju, Nossa senhora do
Socorro, Lagarto, Itabaiana, São Cristóvão e Estância) concentram-se mais da
metade da população 51,1%, segundos dados do censo populacional 2010. Comparado
com os dados da década de 70 onde 39,6% da população viviam nos 6 municípios
mais populosos, verifica-se que o processo de urbanização tem levado a uma
concentração territorial da população, tanto em termos população total, quanto
em termos de população urbana, gerando as assimetrias relacionadas à
distribuição populacional, que associadas ao processo de transição demográfica
que a população sergipana atravessa, tem contribuído inclusive para tendência
de surgimento de vazios demográficos na zona rural sergipana.
A exigüidade
do território sergipano que não exige percorrer grandes distâncias para chegar
até as áreas de concentração econômica e a existência de um sistema de
comunicações (estradas) que permite manter bons contatos com estas áreas,
inclusive em vários casos mais facilmente com estas que com as demais áreas ou
municípios, contribui a manter o desequilíbrio na distribuição espacial da
população.
Entretanto as
assimetrias não dizem respeito apenas à dimensão demográfica, mas também
envolvem a dimensão econômica, sendo as duas dimensões interrelacionadas, já
que o fator econômico é dos fatores explicativos da distribuição da população.
No que diz
respeito a essas assimetrias queremos ressaltar o fato de que em Sergipe a forte
participação da indústria extrativa mineral no desenvolvimento econômico do
Estado, nos últimos anos, associada à grande dependência da economia estadual
de investimentos públicos, foram fatores importante na ampliação dos
desequilíbrios econômicos territoriais, tendo em vista a concentração da
riqueza (PIB) nos municípios com maiores vantagens locacionais e que
seletivamente receberam maiores investimentos do setor público.
Alguns exemplos
desses municípios privilegiados com a presença de recursos naturais e de
investimentos públicos são os municípios de: Carmópolis e Aracaju (petróleo)
Rosário do Catete (cloreto de potássio) e Laranjeiras (uréia). A presença de um
recurso natural (água) e a localização estratégica também favoreceu a
construção, através de investimentos públicos, da usina hidrelétrica de Xingó.
Como exceções
dessa realidade estão alguns municípios considerados pólos no Estado, que
apresentam dinamismo econômico suficiente para figurar entre os maiores PIBs
municipais de Sergipe. Assim, os municípios de Lagarto, Itabaiana, Estância e Propriá, que não
contaram até então, com forte presença da indústria extrativa do petróleo ou
mineral, conseguem se destacar economicamente, ainda que o desenvolvimento
econômico desses municípios também passe por forte investimento público.
A economia sergipana desde a década
de 1970 até os anos mais recentes caracteriza-se por uma dependência direta do
poder público, seja em escala federal, estadual ou municipal, devido, por
exemplo, a forte presença econômica de estatais como a Petrobrás. Havendo uma
redução dos investimentos públicos, ocorre uma redução no crescimento da
economia do estado, o que acaba por contribuir para aumentar ainda mais as
disparidades econômicas regionais.
Analisando
a realidade do PIB por municípios em Sergipe, encontramos que a evolução do PIB
não alterou significativamente o padrão desigual de distribuição espacial da
riqueza no Estado de Sergipe, e os desequilíbrios econômicos se mantiveram e
inclusive se ampliaram durante o período 1999/2004. Os dados do índice de
Williamson calculados por (SILVA et al,
Desequilíbrios e desigualdades regionais no Brasil e nos estados brasileiros.
João Pessoa: Grafset, 2008) para os estados brasileiros no período de 1999 a 2004, demonstram que
o desequilíbrio a nível municipal em Sergipe aumentou neste intervalo de tempo,
posto que apresentava um valor de 0,596 em 1999 e ampliou-se para 1,407 em 2004
Os municípios
que concentram maiores PIBs são em geral os mesmos desde a década 1970, isto é,
além da região da grande Aracaju, os municípios considerados pólos como
Estância, Lagarto, Itabaiana e Propriá. Além destes, se destacam economicamente
em termos de PIB os municípios que apresentam as vantagens locacionais, em
termos de matéria prima que os favorece na localização da indústria extrativa,
principalmente do petróleo, tendo como exceção o município de Canindé de São
Francisco, que é beneficiado pela localização da usina hidrelétrica.
Apesar
do crescimento do PIB em número maior de municípios a partir da década de 1970,
esse crescimento mal distribuído espacialmente, fez com que um maior numero de
municípios se destacasse, porém não resultou em redução significativa da
concentração do PIB municipal e conseqüentemente dos desequilíbrios
territoriais no Estado no período entre 1970 e 2005. Isso indica que as
políticas de ordenamento territorial não tem sido eficazes na redução dos desequilíbrios,
pelo menos até o período analisado.
É importante
ressaltar que o modelo territorial atual sergipano é resultado de um processo
de desenvolvimento desigual que historicamente promoveu um ordenamento
territorial em que determinadas áreas foram privilegiadas em diversos aspectos
(naturais, políticos e principalmente econômicos), gerando assim, condições
desiguais de desenvolvimento e resultando no atual desequilíbrio territorial.
Isto fica bastante claro quando se analisa o processo histórico de formação
territorial e econômica do estado.
Em Sergipe, o
processo o processo de formação econômica e social do Estado, obviamente
inserido no contexto brasileiro, e baseado em um modelo de desenvolvimento
econômico que impulsiona o crescimento econômico concentrado em setores e
territórios, contribuiu fortemente para concentração territorial e social do
poder econômico e político, gerando obviamente um modelo de desenvolvimento
territorial desequilibrado.
É importante
ressaltar que o desequilíbrio territorial historicamente está relacionado por
um lado a um processo histórico de centralização da gestão dos territórios e
por outro a própria lógica de desenvolvimento do sistema capitalista de
produção. O crescimento econômico, em especial dentro do sistema capitalista de
produção, é um fenômeno polarizado e no sentido geográfico necessariamente
desequilibrado (HIRSCHAN apud MARTIN, Desequilibrios Territoriales en España 1800-2000.Zaragoza: Gobierno de
Aragon, 2003), entretanto nas sociedades modernas e democráticas esta
realidade, acaba gerando uma demanda a favor de maior igualdade. É neste
contexto que, advém à importância de buscar, através de políticas públicas,
encontrar maneiras de corrigir os desequilíbrios territoriais.
Ao
se pensar em desequilíbrio territorial, a ênfase está principalmente nas
diferenças econômicas entre as regiões ou outras parcelas do território. Do mesmo
modo quando utilizamos, por exemplo, a expressão disparidade regional se quer
transmitir a idéia de desequilíbrio na base econômica, onde uma região ou
parcela territorial se destaca em relação às demais devido à existência de
vantagens locacionais, associadas às questões políticas, sociais, a presença de
recursos naturais e culturais (SILVA et al, Desequilíbrios e desigualdades regionais no Brasil e nos estados
brasileiros. João Pessoa: Grafset, 2008).
Muitas
das conseqüências desse processo de desequilíbrio territorial são bastante conhecidas
a exemplo das citadas abaixo:
Congestionamentos de áreas
centrais - população, riqueza, trafego, infra-estrutura e serviços.
Uso não racional do território – deixa de utilizar de
maneira e equilibrada os recursos do território, sejam humanos, econômicos ou
naturais.
Dificuldade em possibilitar uma maior homogeneidade da
qualidade vida.
Dificuldade no uso sustentável dos recursos naturais e a
proteção ao meio ambiente.
Dificuldade á respeito da coesão do conjunto territorial o
que pode provocar divergência excessiva entre as partes.
O planejamento
territorial tem então como dos seus principais objetivos o de compensar as
disparidades regionais existentes. A idéia é que os planos de desenvolvimento
territorial estejam pautados na busca por um desenvolvimento sócio econômico
mais equilibrado entre as diferentes regiões, como afirma Bilhim (Coordenação
intergovernamental de políticas públicas e compensações dos desequilíbrios
territoriais: o caso português. Buenos
Aires: Anais do XIII Congreso Internacional del CLAD, 2008) “o ordenamento do território tem como objetivo
último garantir o desenvolvimento sustentável, atual e futuro e a qualidade de
vida das populações”.
Para
amenizar os desequilíbrios territoriais identificados, aponta-se a execução de
um planejamento territorial priorizando compensar as disparidades existentes.
Poderia ser inserida nesse planejamento a utilização de indicadores de
desigualdades e desequilíbrios territoriais que possibilitem o direcionamento
de políticas públicas e os investimentos. A espacialização desses indicadores e
a identificação de regiões de planejamento para reduzir os desequilíbrios podem
ser consideradas como propostas.
Outro pensamento se refere às
políticas de incentivos a investimentos privados em regiões do Estado onde os
desequilíbrios se apresentem mais acentuados e de redução de incentivos em
áreas já bem desenvolvidas. Pode ser citada também como sugestão, a criação de
um fundo de compensação interterritorial, permitindo a utilização de investimentos
públicos em infra-estrutura, serviços, equipamentos e a formação de recursos
humanos nas regiões menos desenvolvidas do Estado, incrementando assim, suas
poucas vantagens comparativas locacionais.
Do mesmo modo,
coloca-se a necessidade de intervenção do poder público através de medidas
reequilibradoras e de impulso ao desenvolvimento econômico. Faz-se necessário o
investimento em infra-estrutura e serviços, em estímulos a iniciativa privada,
na potencialização das cadeias produtivas locais (através da priorização ao
desenvolvimento endógeno, isto é no aproveitamento do potencial local do
território), o que significa a fomentação da capacidade de iniciativa local e
da cultura do empreendedorismo.
* Professor do DGE/UFS.
REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS:
BILHIM, João. Coordenação intergovernamental de políticas públicas e compensações
dos desequilíbrios territoriais: o caso português. Anais do XIII Congreso Internacional del CLAD
sobre la Reforma
del Estado y de la
Administración Pública, Buenos Aires, Argentina, 4 - 7 nov.
2008
FEITOSA, C. O. As Transformações Recentes da Economia
Sergipana: 1970-2005. Dissertação (Mestrado em Economia) – Universidade
Estadual de Campinas – UNICAMP, Campinas, 2007.
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E
ESTATÍSTICA - IBGE. Censos Demográficos, 1970, 1980, 1991 e 2000. Rio de
Janeiro.
___________________.
Contagem Populacional 2007, Rio de Janeiro.
MARTÌN, Rafael D. Desequilibrios Territoriales em España 1800-2000. in Politicas
Demográficas y de Población.Gobierno de Aragón, Zaragoza, 2003.
SILVA, S. B.
de M. e; SILVA, B. C. N.; COELHO, A. S. Desequilíbrios e desigualdades regionais no
Brasil e nos estados brasileiros. Grafset, João Pessoa 2008.
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