quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

O CORAÇÃO DA CIDADE SE ESVAZIA


                                                                                                                                                       Neilson Santos Meneses (DGE/UFS)
O coração de Aracaju está perdendo população e envelhecendo. Os dados do censo demográfico 2010 revelaram a continuidade na redução da população dos bairros centrais da cidade que entre 1996 e 2010 reduziu-se relativamente 11,1%, apresentando uma perda de cerca de 6.800 habitantes. Houve paralelamente um aprofundamento do processo de envelhecimento populacional desses bairros, que em 2010 já contavam com uma média de mais de 13 % de população de 65 anos e mais, o que faz com que a razão de dependência por idosos nesses bairros seja maior que razão de dependência por jovens. Bairros como Centro, São José, Cirurgia, Getúlio Vargas, Salgado Filho, Suissa, Pereira Lobo e Treze de Julho tem perdido população e ampliado à proporção de idosos em suas populações e isso tem ocorrido principalmente desde a segunda metade da década de 1990, embora apresentando ritmos diferentes segundo os bairros.

Esse processo está associado em parte à redução da fecundidade na cidade que a partir de 2000, segundo Meneses (2012), apresenta-se abaixo do nível de reposição. O mesmo autor revela ainda que apesar dessa redução está se espalhando pelos diversos bairros da cidade é nos bairros centrais onde ela é mais baixa. Outro fator relacionado a esse processo diz respeito a pouca atratividade de migrantes para esses bairros que em geral apresentam valor do solo mais caro e, além disso, há um nítido redirecionamento do uso do solo dessas áreas para fins comerciais e de serviços, o que proporciona que durante o dia a área central apresente congestionamentos, ruídos e contaminação e a noite e nos fins de semana um esvaziamento que define um cenário quase fantasmagórico e também um estimulo ao uso “marginal” do espaço.
 Vale destacar que contribui ainda para o esvaziamento dos bairros centrais, a política habitacional que induz a localização da população de baixa renda em áreas mais afastadas da zona central da cidade, onde predomina o sentimento de exclusão e onde se favorece o aparecimento, de maneira mais nítida, de várias patologias sociais (Deserção escolar, gravidez na adolescência, drogadição, ociosidade entre outras). Já os projetos imobiliários mais caros buscam proporcionar a população de renda mais alta opções de residência em novos bairros que apresentem qualidade de vida diferenciada, associada principalmente a novos conceitos de estética paisagística e exclusividade social, como os condomínios horizontais fechados ou os grandes projetos imobiliários multifuncionais, surgindo daí a cidade dos ricos, elitista e em geral também fora das “normas urbanas”. No processo de produção do espaço urbano da cidade de Aracaju parece clara a opção de construir sempre o novo, quando há muitas vezes possibilidades e às vezes mais vantagens em reformar o antigo.
O resultado dessa dinâmica implica em aumento da mancha urbana da cidade, provocando diversos impactos socioambientais e demográficos, a exemplo do aumento de áreas segregadas na cidade (contribuindo para aprofundamento das desigualdades socioespaciais), da ampliação das distâncias a percorrer, o que induz a necessidade maiores deslocamentos motorizados e a ocupação de novas áreas de proteção ambiental, como os manguezais. Parece claro que essa ordem urbana se insere em um contexto  cíclico de expansão do capital, que estimula uma nova organização social do território e que cria as condições, através da articulação entre Estado, Capital e Cidade para plena circulação do capital, ampliando assim a mercantilização da vida urbana.
Entretanto sabe-se que a “renovação” do centro de grandes e médias cidades já é uma perspectiva que apontam vários centros urbanos na América Latina, incluindo cidades como Rio de Janeiro e São Paulo, como nos informam Memoli e Rivière d’Arc (2013) segundo os mesmos “A revalorização dos centros das grandes cidades é, atualmente, uma aposta comum da maioria dos governos de importantes cidades latino americanas, processo que envolve resgate da memória, requalificação econômica, programas sociais e mobilização da sociedade. Essas são algumas das ideias colocadas em prática por vários países e que cada cidade, à sua maneira e levando em conta suas singularidades, busca implementar”.
Em Aracaju, ainda não se observa nenhuma iniciativa política concreta nesta direção. E enquanto isso se verifica nos bairros centrais, que também correspondem às áreas mais antigas da cidade, muitos edifícios e casas já não são utilizados pra fins residências e vários deles já apresentam sinais de abandono, no centro, por exemplo, segundo dados do censo 2010 do IBGE, 23,2% dos domicílios não estão ocupados. Porém é nessa região onde a população idosa mais se concentra e passa a ser dominante, envolvendo assim novos desafios para a gestão da cidade, como desenho de novas políticas sociais e de infraestrutura de suporte a essa faixa de população. Os novos arranjos espaciais que caracterizam a dinâmica da distribuição espacial interna da população em Aracaju em sua nova configuração desdobram-se em varias necessidades e especificidades, entre elas o surgimento de novas centralidades que despontam na cidade, sendo um importante campo de estudo para áreas como a Geografia.
Por fim, ressalta-se que o estudo da dinâmica espacial da população e seu perfil etário na escala micro ou de bairros revela-se um tema importante para um planejamento mais eficaz, na medida em que possibilita que ações pontuais possam ser melhor direcionadas. A utilização do bairro como unidade de análise, segundo diversos autores, representa por vezes uma possibilidade privilegiada de compreensão da interação social, e pode contribuir para gestão, planejamento e empoderamento da população.

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