terça-feira, 30 de maio de 2017



ENTREVISTA AO BLOG DEPOIS DOS 50 - http://blogs.oglobo.globo.com/depois-dos-50/

LINK PARA ENTREVISTA N O BLOG

Geração sanduíche: os dilemas de quem cuida de pais e filhos ao mesmo tempo

As demandas são muitas. Enquanto os pais precisam de cuidado, os filhos - muitas vezes já adultos mas ainda em casa - também solicitam esforço. Entre ascendentes e descendentes - todos dependentes - uma geração imprensada cresce a olhos vistos de quem pesquisa a demografia do território brasileiro e seu caráter nada estático. Trata-se da "geração sanduíche", explica o professor do departamento de Geografia da Universidade Federal de Sergipe (UFS) Neilson Santos Meneses. Doutor em ordenamento territorial e meio ambiente pela Universidad de Zaragoza, Espanha, ele tem concentrado sua pesquisa na área da geografia da população e análise de indicadores sócio-demográficos para o planejamento e gestão pública.
Integrante do Núcleo de Ações e Pesquisa para a Terceira Idade/NUPATI-UFS, Neilson fez parte da equipe que implantou a Universidade Aberta a Terceira Idade da UFS, Neilson ressalta, com base em dados e na literatura já disponível sobre o tema, que as novas responsabilidades que se impõem podem comprometer da saúde ao bolso. Quem entra no grupo dos cuidadores e provedores precisa reestruturar a vida e as relações, estar pronto para os conflitos geracionais inevitáveis, o trabalho excessivo e não remunerado e tampouco reconhecido.

O que caracteriza a geração sanduíche?
A chamada “geração sanduíche”, “geração imprensada”, “geração do meio” ou “geração pivô”, segundo a literatura sobre o tema, é a geração que se situa entre país idosos, filhos e algumas vezes netos. É aquela que se vê desafiada a fornecer suporte às gerações ascendente e descendente, o que a pode levar a uma sobrecarga no fornecimento de cuidados. Outra característica dessa geração, também segundo pesquisas recentes, diz respeito ao perfil de renda, ou seja, essa geração se concentra na faixa intermediária de renda. E a explicação é relativamente simples: os mais pobres não teriam como arcar com o suporte financeiro para cuidar de idosos e os mais ricos podem terceirizar, isto é, pagar pelos cuidados.
Trata-se de um fenômeno recente. Mas já é possível mensurar e reconhecer as causas e consequências?
Vale ressaltar que é o alongamento da vida que provoca um aumento do número de gerações coexistindo em um mesmo período histórico e social, é também o fenômeno da juventude extensiva e situações complexas em termos de mercado de trabalho - a exemplo de empregos precários, instáveis e maior desemprego entre jovens, o que dificulta sua emancipação - que caracterizam a conjuntura da geração sanduíche e da multigeracionalidade. Finalmente, se deve destacar o caráter relativamente recente desse fenômeno, especialmente no Brasil, e a dificuldade de mensuração empírica especifica das pessoas pertencentes a essa geração. Há uma importante variação de metodologias, o que leva alguns estudos a apontarem impactos positivos e outros que destacam resultados negativos desse fenômeno.
A faixa etária parece flexível. Quem forma essa geração?
De uma maneira geral, essa geração é formada por pessoas de idade intermediária, não havendo consenso nos estudos realizados até então, quanto a um intervalo fixo relativo a faixa de idade. E algumas situações tendem a fazer diferença, como, por exemplo, quando pessoas dessa geração se aproximam da sua fase idosa isto traz um maior desafio de cuidar das demais gerações. Isto é, ao mesmo tempo necessitam conciliar o início da sua própria fase de necessidade de cuidados com a responsabilidade de cuidar. Além disso, a corresidência de distintas gerações também pode produzir novos desafios de convivência. Já no caso de não haver a habitação conjunta, a distância pode gerar outros obstáculos para a tarefa de cuidar.
Há também uma questão de gênero, ou melhor, quem cuida mais ainda é a mulher?
As questões de gênero que ainda atribuem a função de cuidar à mulher, o que torna essa geração majoritariamente formada por mulheres. Isso ocorre a despeito de que cada vez mais homens nela se insiram.
Essa tendência pode mudar, então?
O contexto de pesquisas sobre o fenômeno da multigeracionalidade e da geração sanduiche no Brasil ainda é pouco trabalhado, o que não permite, até então, fazermos afirmações mais fundamentadas. Autores como Buz Delgado e Bueno Martínez apontam que cada vez menos os filhos estão dispostos a cuidar dos pais quando estes chegam à velhice. Assim, é possível que no futuro o “abandono” seja maior, devendo prevalecer decisões mais pragmáticas do que as baseadas no pacto de solidariedade intergeracional até então estabelecido. Entretanto, ressalto que são necessários mais estudos para comprovar essa tendência.
Quanto a condição financeira de uma família multigeracional influencia na convivência entre os seus membros?
Na medida em que as famílias possam pagar ou terceirizar o cuidado, este é um fator facilitador. No entanto, a pressão pela atenção e doação do próprio tempo ainda vão continuar a existir. Além disso, temos que ter em conta a questão da oferta de mão de obra especializada, os cuidadores, ainda insuficiente no Brasil.
Quais os conflitos mais comuns que essa geração enfrenta?
Sem dúvida, os conflitos envolvem o dilema de se ajustar às novas responsabilidades familiares, demanda de reestruturações relacionais e multiplicidade de novas experiências que essa geração passa a enfrentar.
O senhor pode dar exemplos?
No primeiro caso, a nova responsabilidade que se impõe é fornecer cuidado a gerações ascendentes. Do ponto de vista da demanda de reestruturações relacionais, “ao tornarem-se “pais” dos seus próprios pais, alguns experimentam a perda de suporte da geração anterior, ao mesmo tempo em que devem adaptar-se à tardia emancipação dos filhos, o que acaba condicionando a vida dessas pessoas, o que pode elevar os níveis de ansiedade, estresse e depressão, além de conflitos intergeracionais. Já a multiplicidade de novas experiências que essa geração passa a enfrentar diz respeito, por exemplo, ao trabalho realizado, que consome tempo, mas não é remunerado e tampouco notado. Segundo a socióloga Duran Heras, eles seriam assim uma espécie novo proletariado ou “cuidadoriado”. Essa geração enfrenta ainda conflitos econômicos, porque os gastos aumentam, e psicológicos.
Como é possível solucionar ou amenizar esses conflitos?
Não são conflitos de fácil solução. Porém, algumas ações poderiam minimizar os prováveis impactos negativos, como maior incentivo à construção de redes de apoio familiar, de amigos e comunitária, que surgem como alternativas para amenizar a sobrecarga imposta à geração sanduíche. Ações educativas e informativas que permitissem construir uma nova percepção sobre o envelhecimento, desmitificando os estereótipos existentes; horários flexíveis de trabalho remunerado para as pessoas "ensanduichadas" responsáveis pelo cuidado. Outras alternativas podem surgir com o aprofundamento das reflexões. Além disso, o “viés geracional” é considerado crucial para as políticas públicas no Brasil, também segundo estudiosos, tendo em conta a necessidade de construção de estratégias de apoio que se tornam essenciais para um maior desenvolvimento social.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

 

Blogroll

ibge